Quanto mais longe mais perto
E sinto frio quando o silêncio
adormece ao meu lado
Não deixes a chama apagar
este sopro de vida
Oferece-me lírios
e o verão não terminará ainda
Nem o perfume das tuas mãos
se evaporará das minhas
anda
vem comigo ao campo
apanhamos lírios
junto da velha cameleira
e deitados no musgo macio
olhamos os pássaros no céu.
E as flores serão as únicas testemunhas
de que caímos de amor,
Elas e as nuvens que passam por cima de nós
Há palavras que são curtas, mas são sôfregas. Dizem tudo o que o pensamento retem, o que o corpo deseja, o que a saudade aumenta. Há palavras que nem chegam a ser escritas, ficam no silêncio do pensamento e apenas os sentimentos das almas gemeas as escutam, porque as adivinham, porque também as sentem.
Seriam poesia se os poetas também sentissem a saudade que esmaga e sufoca na garganta, as palavras que o coração ecoa.
Assim acontece quando a conversa busca todos os sentidos e mesmo na distância são os sentidos que se tocam, que se deixam envolver e seduzir numa dança de dois corpos que se sentem sem se verem. É magia.
E não é assim no amor? Para haver amor tem que haver gente dentro do sentimento, senão é um vazio. Sufoca na distância, incomensurável da espera, da tarde que adormece na noite escura, sozinha mas na companhia do sonho e da loucura de um acordar de novo e de novo viver o encantamento da viagem. E tudo na vida envolve riscos até o amor. E os riscos trazem conhecimento e sofrimento, crescimento e maturidade, sabedoria e vida e tanta felicidade.
O amor é fodido. É título de romance, mas é a dor de não nos podermos deitar com as palavras nem quando navegamos dentro das palavras que dizemos.
Maus amantes são os que não sabem despir suavemente uma mulher das palavras e dos temores, são os que amam as borboletas e não conhecem as suas metamorfoses. Porque é o tempo que torna tudo mais suave, que dá os contornos da perseverança e da capacidade de ultrapassar os obstáculos, como o rio na sua viagem entre a nascente e a foz.
Viagem de amor é caminhar de encontro ao outro, mesmo quando ambos levam caminhos diferentes que se cruzam quando se despem para se entregar como se estivessem a escrever um conto. E no tempo em que tecem a teia do fio que os une, desfazem os nós do caminho na espera, e enquanto esperam, fiam novos silêncios que terminam em longos e demorados abraços que levam sorrisos dentro deles. E quando partem vão tristes, a única voz que ouvem é a do vento.
@Maça de junho
Nos braços da noite
adormeci, vazia do dia
em que não te vi. Na rua
não estavas, cá dentro
faltavas, nem carta
de ti, nem encontro
marcado. Procuro por ti
no orvalho molhado.
Encontro a saudade
no amanhecer. Sonhou
nos teus braços e sorriu
acordada. Por ser tua amada
por ser mulher, desejada.
No calor do café, encontrou
a suavidade do teu beijo.
E nesse instante foi feliz.
@Maça de junho
Atingiu o limite da paciência. Sem
tempo para a sentença mantinha a
interrogação do costume: o que faria na penumbra do umbral, como se ali tivesse sido posta em sossego, naquela irritante pose de diva
em sessão fotográfica? Humildade
tinha pouca. De nada lhe valia a adversidade
com que a confrontavam diariamente no jornal.
A ela que nunca perde o aroma da
ventania, não irá perder a oportunidade de chegar a redatora chefe.
Está escrito nas estrelas.
Atingiu o infinito da irritação. Sem azáfama, para a desconfiança mantinha a tranquilidade
do costume: o que faria na claridade do umbral, como se ali tivesse sido
posta em bulício,
naquela irritante pose de diva em sessão fotográfica? Altivez tinha pouca. De nada lhe
valia a contingência
com que a confrontavam diariamente no jornal.
A ela que nunca perde o aroma do suspiro,
não irá perder a oportunidade de chegar a redatora chefe.
Hoje Manuel António Pina completaria 70 anos. Repletos de dedicação às letras, à prosa e à poesia. Um jornalista que nasceu poeta. Descobri-o no Jornal de Notícias e depois a poesia e depois ainda o amor que tinha aos seus gatos. Tanta afinidade por um homem que nunca tive o prazer de conhecer pessoalmente. Fui eu quem ficou mais pobre, certamente.
Em 2006 nascia o meu filho e na visita à feira do livro não resisti em comprar para ele a nova edição do Têpluquê e outras histórias. Depois li-lhe o livro como se de uma história de embalar se tratasse e tratava. Hoje lembrei-me de vir fazer um post sobre um homem que me ajudou a encontrar o meu papel de mãe. Hoje sou a mãe que sou porque na minha vida se cruzou um poeta de nome Manuel António Pina.
Havia uma flor! Nem eu sabia onde é que a flor havia mas tanto fazia. Talvez houvesse onde ninguém soubesse ou fosse uma flor de estar a haver só na minha imaginação, ou não fosse uma flor, fosse uma canção. Nem a flor sabia que existia. em qualquer sítio, sem saber, floria. E se fosse uma canção cantava e não se ouvia. E isso acontecia no meu coração. Não sei se era uma flor se uma melodia, era qualquer coisa que havia, e cantava e floria dentro de mim sem razão. ia pela rua e ninguém diria. As pessoas passavam e eu dizia: "Bom dia!" E ninguém suspeitava o bom dia que fazia em qualquer sítio que dentro de mim havia! Só eu sabia e sorria, Levando-te pela mão.
Manuel António Pina O TÊPLUQUÊ e outras histórias Assirio & Alvim, edição de 2006
Ser mãe é deixar coisas por fazer para fazer as coisas dos filhos (e dos outros também). Mães têm sempre coisas para contar. E por tudo aquilo que conta, fica ainda tanta coisa por contar. Podemos escrever todos os dias, mas há coisas que não se conseguem escrever, porque apenas se sentem. E escrever emoções é mesmo complicado. Mãe é dar beijinhos até arderem as bochechas, é fazer rir mesmo que a dor de cabeça esteja insuportável, é fazer luta de almofadas até arrancar cabelos, sem um queixume.
Mas também é para por a pensar, para repreender quando necessário, para lembrar as regras de cidadania e convivência saudável a todas as horas.
Quando uma criança pensa, a filosofia ganha um poeta. As atitudes trazem consequências e no caso infantil, crescimento, que deve ser harmonioso e consequente. A singularidade das crianças encontra-se nas interrogações, no questionar, no perguntar. Depois a aprendizagem está em saber ler, não apenas as palavras, mas o mundo que nos rodeia, o mundo onde a criança se insere.
Pois como escreveu Rousseau: "A criança só deve fazer aquilo que quer; mas deve querer apenas aquilo que vocês querem que ela queira; não deve dar um passo sem que vocês o tenham previsto; não deve abrir a boca sem que vocês saibam o que ela vai dizer. Deixem que o vosso aluno acredite ser sempre ele o mestre, quando, na verdade, são sempre vocês que o são."
As castanhas atapetavam o souto em toda a sua extensão, um casode ouriços. Por vezes a soca soltava-se do pé ligeiro, enterrada
nas folhas fofas e coloridas que o outono pintara de cores amarelas e ocres. Nas
tocas ocas dos castanheiros, cogumelos
nascidos do húmus amolecido. Um venenoso, osca,
até dava asco. O sacosarapilheiro já cheio, esperando
quem o cosa.
Logo as coas,
acompanhando o vinho novo vai terminar num caos.
Tradições de São Martinho!
Adoramos pratos de bacalhau. Todos os pratos, de todos os feitios. Apenas uma condição: não pode estar salgado, coisa que é muito frequente em restaurantes.
E nos dias cinzentos surgem muitas formas de os colorir. As árvores ainda não amareleceram completamente, mas os dias que terminam cedo e a chuva que cai lá fora é já sintoma da estação outonal que vivemos em plenitude. As castanhas espreitam já dos ouriços abertos e chamam para uma sobremesa calórica.
Até um prato simples enche de cor e de sorrisos um rosto que muito embora sereno, revela um olhar triste e sem sentido. A mentira dói mais que mil verdades e todo o coração que ama sem limite nem imposições, sabe reconhecer, mesmo quando embrulhada em doces sentimentos. Para espairecer e fechar os olhos às amarguras que as nossas opções de vida acarretam, enquanto refugiada na cozinha ( da mãe) e ouvindo Ben Howard que através dos ouvidos consola a alma.
Além disso fim de semana, também é preciso consolar a mãe, cozinhando um prato do seu agrado e que possa sobrar para depois ela aquecer para a sua refeição de segunda feira, quando voltar a ficar sozinha.
E ela adora gratinados, principalmente de bacalhau. Assim foi num fim de semana triste, de fieis e de gente infiel a tudo o que são os princípios da lealdade. Mas um fim de semana de afetos, de mimo no estômago e de algumas picadelas nas mãos e no coração.
O bacalhau eis que ficou assim:
500 gr de bacalhau (3 postas demolhadas e desfiadas) Batatas fritas em palitos grossos Molho bechamel (usei do de compra) Duas cebolas pequenas e dois dentes de alhoAzeite qb Queijo para gratinar a gosto Para decorar azeitonas ou pedacinhos de pimento vermelho (ambos)
Num tacho refoga-se a cebola e os alhos picados em azeite. Adiciona-se o bacalhau demolhado e escorrido e deixa-se estufar um pouco. Juntei metade do bechámel e as batatas envolvendo tudo . Deixa-se ficar assim ao lume (muito brando) e tapado uns minutos. Num tabuleiro que possa ir ao forno deita-se o preparado e por cima o queijo envolvido com o restante bechámel. Foi a gratinar com o forno a 180º até estar douradinho . Garanto que é muito saboroso e muito rápido . E nós adoramos! @Maça de junho