segunda-feira, 21 de julho de 2014

João Ubaldo deixou a Casa e foi ao encontro dos Budas


Nunca tinha lido A Casa dos Budas Ditosos, porque temia que fosse excessivo, porque temia muito provavelmente a sua influência. Não há nada mais nocivo na vida das pessoas que o desconhecido. E realmente desconhecia a forma mágica, irónica e real como se encontra expressa neste romance. Repleto de episódios, de sonhos, de desejos, de anseios, de remorsos, de experiências ou apenas considerandos vários, sobre o percurso sexual de cada adulto. 
Um percurso que se vai construindo através da vivência sexual, da experiência de vida e dos relacionamentos mais ou menos pitorescos que cada um vai guardando. 
Um belo dia e depois de ler uma crónica sobre a obra de João Ubaldo Ribeiro e mais precisamente sobre a sua capacidade de escrever sobre a vida erótica de cada um, tomei coragem e atirei-me a ele, o livro. E fiquei agradada e arrependida, isso sim, de não o ter lido mais cedo. É um texto puramente erótico sim, mas sem parecer pornográfico, é antes um exercício de como o erotismo e a escrita podem andar juntos.
Eu como tantos outros, já tive experiências entre a escrita e o sexo, embora em separado, mas depois de ler este livro percebi a forma quase mágica, diria, como se completam.Escrever sobre o amor é fácil, ou não, mas é pelo menos um tema apetecível, porque o amor, é bom sonhar com ele, eu diria mais, viver com ele. Já o sexo, essa palavra obscena para tantos, indizível para outros, mas se pensarmos bem, ninguém sobrevive sem ele, seja qual a for a forma pelo qual o corporiza, é a parte escura do eu, é a face negra da lua, é a negação social versus a perfeição do eu. 
Podemos dizer que no livro há normas transgredidas, assim como na vida, e também há lá sensualidade como todos procuramos ter na nossa vida, mas como a vida é apenas o rascunho que nunca vamos conseguir passar a limpo, o melhor é ler o livro de João Ubaldo, ou reler, ou ler todos os outros que ele escreveu, e desta forma homenagear o escritor que tinha um olhar de quem estava sempre a sorrir, provavelmente porque ao olhar os outros estava já a imaginar a cena de sexo com o parceiro, ou a memorizar a personagem na sua frente para depois transpor para as histórias. 
O seu sorriso e a sua forma de escrever deram-me uma visão mais completa do mundo, espero pois que o seu sorriso continue a fazer brilhar a imaginação de muitos encontros ou desencontros. João Ubaldo deixou a Casa e foi ao encontro dos Budas. Que sejam ditosos todos quantos encontrar.

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