sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Canção de Batalha



Que durmam, muito embora, os pálidos amantes,
Que andaram contemplando a Lua branca e fria...
Levantai-vos, heróis, e despertai gigantes!
Já canta pelo azul sereno a cotovia. E
já rasga o arado as terras fumegantes...

Entra-nos pelo peito em borbotões joviais
Este sangue de luz que a madrugada entorna!
Poetas, que somos nós? Ferreiros d'arsenais;
É bater, é bater com alma na bigorna
As estrofes de bronze, as lanças e os punhais!

Acendei a fornalha enorme - a Inspiração.
Dai-lhe lenha, - a Verdade, a Justiça, o Direito
E harmonia e pureza, e febre e indignação;
E p'ra que a lavareda irrompa, abri o peito
E atirai ao braseiro, ardendo, o coração!

Há-de nos devorar, talvez, o incêndio; embora!
O poeta é como o sol: o fogo que ele encerra
É quem espalha a luz nessa amplidão sonora...
Queimemo-nos a nós, iluminando a terra!
Somos lava, e a lava é quem produz a aurora!

Guerra Junqueiro, in, Poesias Dispersas







quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Desafia Sim!


Era um blogue de palavras
Setenta e sete, apenas e tão só
A cada dez dias um tema
Desafia que mete dó

Há sílabas que não encaixam,
Regras para cumprir
Palavras que não se cruzam
E o prazo a sucumbir

Há consoantes proibidas
Vogais que são sinais
Um barco que não navega
Ou que não chega ao cais

Escrever é inventar nova alegoria
O mar uma imensidão
Ao céu traz poesia

A Margarida uma flor na mão!

Publicado no blogue: histórias em 77 palavras






quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Olhares

Gostos não se discutem, é uma afirmação vulgar, para justificar opções diferentes, para evidenciar critérios nas nossas escolhas, para ostracizar alguém, ou simplesmente para dizer alguma coisa, quando nada de muito interessante ocorre. E todos gostamos de ser olhados. Todos gostamos de ser apreciados. Todos gostamos de sentir o olhar do outro gostar. Até no facebook gostamos de contar os gostos nas nossas publicações. Muitos gostos pode ser sinónimo de agrado, mas pode significar o contrário. Mas a vida real traz outra adrenalina, outras reflexões, outros pontos de contacto. Gostamos de olhar para a imensidão do mar e descansar a vista nas longas planicíes, deixa-la prolongar para além dos vales e levantar-se para o cimo das montanhas. Gostamos de contemplar o céu e as estrelas, os cometas e o brilho azul escuro do universo ao entardecer. Deixamos-nos enternecer com as crianças a brincar. 
O prazer que um simples olhar nos dá supera muitos outros que por vezes procuramos sem nem saber onde. 
Quando olhamos para o outro, profunda e demoradamente, não precisamos dizer nada, para saber e sentir o quanto esse olhar nos está a fazer bem. E sentir o quanto se torna relaxante para o outro. Tenta fazê-lo e verás com teus próprios olhos. Não. Sentirás no teu corpo o quanto esse gesto te fará bem.  Basta olhar e ser olhado, olho no olho, coração com coração. Esta é uma via directa para mergulhar em níveis profundos de intimidade e, por isso, poderá incomodar e amedrontar, num primeiro momento, ao fazer sair da zona de conforto que sempre queremos manter.
Olha um pouco, frente a frente, descontraída mas com atenção plena ao outro e ao momento. Se sentires necessidade de desviar o olhar, procura dentro de ti o que te incomodou, que memória aflorou, que sentimento despontou, respira profundamente e volta a tentar. Sê persistente. Capta a atenção do outro de forma a entrarem ambos no jogo, mas sem haver palavras proferidas. Não quebrem o silêncio, para que seja mais intenso e profundo o jogo.
Se te sentes mais à vontade, atenta à respiração do outro, continuando a olhar profundamente, e começa a respirar sincronicamente com a sua respiração, se te for confortável. É natural que o outro também se ajuste, inconscientemente, ao teu padrão de respiração. Permite-te mergulhar mais fundo no olhar dele e no teu corpo, para sentires a plenitude.
O nível de intimidade que esta prática traz é profundo, límpido, verdadeiro, proporcionando laços de amor ainda mais próximos, compreensão e empatia, bem-estar e preenchimento e até excitação e renovado desejo!
Vale a pena refletir sobre o olhar, vejam com os vossos olhos e depois comprovem verdadeiramente com o vosso olhar. O olhar é um sentido fabuloso. Experimenta fazê-lo. Vamos fazê-lo juntos.
@Maça de junho



terça-feira, 28 de outubro de 2014

Sou o que sou


Sou pássaro que voa sem parar
Que pousa no teu ramo a chamar

Sou letra que soletra o teu pensar
Que escreve o que não pensa

Sou flor para te beijar
Quando em mim pousares os lábios

Sou tua!

@Maça de junho




segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Espaço interior


Entro no meu espaço interior
Porque já anoiteceu aqui
Nem o corpo reage à letargia da hora.

São os sentidos quem primeiro vê a luz do sol morrer
E adormecem na mansidão do dia que finda
E no silêncio que paira ficam apenas as palavras que escrevo
A vida que a cada abraço se renova,
E em cada gesto do mundo se evapora
Afinal é a mesma vida que todos os dias amanhece connosco
Até nos dias em que não estás,
És tu quem se ausenta de ti e de mim, mas a mística de nós essa vive
Nas horas em que o sol aquece, e nas horas em que a sombra paira.

Porque ainda tenho para te dizer
Tudo o que já dissemos
E guardamos no nosso espaço interior.

@Maça de junho





Praia em outubro ao cair da noite

domingo, 26 de outubro de 2014

Atonement

Neste outono algo triste e de sol intenso e pouco reparador
Sedento de ternuras vadias e encontros meditativos
Por vezes fugidios e ausentes.
Onde até a frescura do dia se ausenta
Para lá do horizonte
Não conto senão as horas
Para voltar a ser feliz
Ou talvez não!

@Maça de junho



Atonement is a 2007 British romantic drama war film directed by Joe Wright and based on Ian McEwan's 2001 novel of the same name. The film stars James McAvoyKeira KnightleySaoirse RonanRomola Garai, and Vanessa Redgraveand chronicles a crime and its consequences over the course of six decades, beginning in the 1930s. It was produced by Working Title Films and filmed in England and France.

Wikipedia

Atonement UK poster.jpg



quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Palavras 77

Escrever sem dizer nada
Dizer bem e escrever mal
parece ser genial! Sinal!

Palavras,
Setenta e sete
Às vezes, é infernal!

Desafiar saberes,
Acrescenta, imagina
Tece a teia e desafina!

Matemática calculada
Adivinha lá
letras, alfas e beta, sem teta
Nem gama, apenas capa
e siga!

Acerta e farás feliz
Aquela que a desdiz

Acaba, termina já,
Há sinais e cardeais!

Penitência acabada
ganhará a mais negada
pegada verde, azar de rã
até à  seguinte da anfitriã!

@Maça de junho

Publicado em 77palavras.blogspot.pt


Porto: Portugal







terça-feira, 21 de outubro de 2014

Na contemplação do belo  
Perante a serenidade do amanhecer
Deixa-te enternecer
E no canto dos pássaros
Embala a alma 
E  fica apenas a ser feliz.

@Maça de junho

sábado, 18 de outubro de 2014

Na cor do outono

Gosto dos dias de chuva no outono, para ficar com o rosto colado à janela a sentir no vidro o contacto das pingas, e a deixar que o olhar perdido dentro de mim, percorra os caminhos da bruma branca que avança lá fora, e do silêncio que paira cá dentro. Escolho as palavras como se fossem esteios onde me agarrar, para não perder a razão da existência por vezes perdida, por vezes um guia de mim, entre mil pensamentos e a procura de mim. Procuro por entre o cinza da paisagem, o esvoaçar tímido de uma ave, sigo com o olhar o voo da folha entre a árvore e o chão, como se fosse de mim que se desprendesse, como o desligar de uma paixão que por vezes não passou apenas de uma traição. É no outono que as cores vão morrendo, ou é o outono que guarda o colorido que pinta.
Acredito em ti, na brevidade do encontro entre palavras e silêncios, entre preocupações e resoluções jurídicas, entre a família e a actividade cívica, entre o devaneio e as promessas não cumpridas. Acredito no amor, como se de poesia, por vezes proibido, por vezes uma aventura, por vezes não passando de um encontro revolucionário, resistente, suportando o sal das lágrimas e a força do vento que o verga.
Acredito que não são precisos adjectivos para além do tempo preservarmos as memórias, como as flores não precisam da eternidade para prevalecer. A palavra é sempre mais que um corpo onde as sílabas se encaixam e se abraçam, a palavra é o nosso encontro, até quando a única evidência é o chão que me suporta.




Outono nasce nas árvores ou são elas que se enamoram dele


domingo, 12 de outubro de 2014

Caminhos do Romântico


Mas tu sabias o quanto chove no outono. Se querias fazer o caminho Romântico entre a rua do Gólgota e os jardins do Palácio de Cristal, bem sabias que deverias levar chapéu. Agora mais pareces um pato ensopado a sair do lago. Mas tu sabias que o melhor desta cidade cinzenta e triste, onde pedras graníticas encerram histórias de encantar e desencantos de assombrar, é mesmo assim. Inesperada e sombria. Ah! Se sabias! Inesperado… encontrar a canforeira!


Canforeira – árvore centenária existente na Rua do Gólgota, (junto à Faculdade de Arquitetura) no Porto
@Maçã de junho

Desafio publicado no blogue : histórias em 77 palavra



Canforeira

terça-feira, 7 de outubro de 2014

No sal da vida

Hoje deu-me para pensar diferente. Talvez pense diferente porque tenho um percurso diferente, uma percepção do mundo e da vida diferente. Por vezes é a própria vida que nos vai livrando de fardos pesados, e nos deixa libertos para ver com mais leveza o dia nascer e percorrer com serenidade as horas vão deslizando.
Vem a propósito o fazermos coisas "proibidas". Depende, vou pensando. Que tipo de proibido? Pela sociedade hipócrita e preconceituosa? Se assim for, nem vale a pena pensar muito. Pois nem vale a penas dar crédito a opiniões malévolas. Há coisas proibidas que fazem bem, se fazem bem, são boas, se são boas, deveriam ser feitas sem culpas, nem juízos de valor. Bem, também não é tento assim, há regras que devem ser respeitadas, há a condição humana que deve estar sempre presente. Há um ditado que diz: para apregoar a paz deves ter a paz dentro de ti. A todo instante podemos renascer. Não esperemos pela ultima estação para voltar ao cais. Não esperemos que a velhice nos atropele o pensamento e a atitude. Ser feliz é levar para o futuro a experiência de vida, a que se viveu, a que se sonhou, e a que nos frustrou. Ser adulto não é ser apenas assertivo, responsável, é ser louco com consciência. Poderíamos chamar-lhe a última estação antes da velhice, é a idade esquecida, entre o ser adulto e responsável e o deixar-se envelhecer sem objetivos para futuro, nem um presente criativo e especial.
E ser velho entre o desgaste fisico dos anos eo esvaziamento da memória liquefeita, ora pela doença, ora pelo gasto que lhe foi dado duramente desde a floração e o amadurecimento, de nada serve se não fizemos o caminho que existia dentro de nós. Percorrer cada um o seu caminho interno, é abdicar de muitas coisas, é saltar para alcançar outras, é viver, é doer e sofrer, é rir e chorar, é crescer e abraçar a noite que existe dentro de nós.
@Maçã de junho



Foto:internet

sábado, 4 de outubro de 2014

Metáforas

Nascera por entre o arvoredo do Buçaco
Inexprimível desilusão!
O pai, esse nunca chegara a conhecer,
Infortúnio cruel…
A infância perdida por alcofas e brocados
Assim foi!
Depois de muito tempo, veio o sol
Estava enamorada
No dia transparente em que recebeu flores
Bonito ramo,
Bom gosto revelado na combinação das cores…
Tonalidades várias
E quando abriu a janela do mundo
Deixou-se enlouquecer
Invadida pela volúpia de tão apaziguador sentimento
Morria agora
Não fosse hoje, tarde demais.

@Maça de junho

publicado no blogue: histórias em 77 palavras




quinta-feira, 2 de outubro de 2014

O que te daria eu ontem
quando não te conhecia?
E amanhã, o que darei
se hoje não te dei
o que devia?

O que te dou é apenas
sombra do que querias.
Dou-te prosa, e o desejo
era dar-te poesia.
Affonso Romano de Sant'anna