Um apontamento de um amigo despertou
a minha curiosidade para a história e para o passado dos impostos. Em tudo há
um passado, uma história e um percurso de sucesso ou de trevas, consoante a
época e as necessidades do momento, e nos impostos também assim sucedeu ao
longo dos séculos. Se abordássemos a questão dos impostos ao longo dos livros
Bíblicos, raras seriam as exceções em que não se fale de tributo, de imposto ou
de dízimo. No Antigo Testamento no livro de Génesis lê-se: “E Abraão deu-lhe o
dízimo de tudo”. Também os imperadores Romanos e Júlio César em particular são
pródigos na demanda dos impostos e dos tributos, e os seus soldados
(publicanos) eram capazes de todas as crueldades para alimentarem a ganância e
os privilégios.
Os impostos existiram em
todas as sociedades na forma de reconhecimento ao sacerdote ou ao príncipe,
pagando-lhe com a décima parte da colheita, cereais, fruta, vinho, azeite, lã,
queijo, couro, mel, a oferta de primícias como precursor do imposto de renda.
Estudar impostos é uma
disciplina nunca terminada, nunca verdadeiramente apreendida, em mutação e
evolução constante. Todo o tipo de impostos me cativa, todos eles trazem sempre
algo de novo e de estimulante, mas há um que supera tudo e todos. É o imposto
sobre o rendimento. Gostaria de o perceber mais justo, mais equitativo, mais
propiciador de redistribuição de riqueza, de amortizador de assimetrias,
estimulante ao consumo e à poupança, propiciador de externalidades sempre que o
custo marginal conseguisse atingir o ótimo social. Uma utopia, dirão alguns. Uma
injustiça, a outros se poderá ouvir, geralmente aqueles que pagam sempre. Para
um pagador de impostos, o imposto mais justo será sempre aquele que os outros
pagam.
Mas voltemos à questão que
me provocou a curiosidade, e que me levou a ler mais sobre as teorias dos
impostos, melhor, fui ler a tese a que respeitava o apontamento. A tese em
causa. Fiquei deslumbrada, quase tanto quanto uma criança ao descobrir o brilho
das luzes de natal, ou quando recebe o presente mais desejado. Não imaginava a
existência de um estudo tão singelo e ao mesmo tempo tão oportuno sobre a questão
dos impostos diretos e indiretos, e sobre a forma de promoverem um orçamento
equilibrado ou não, pela mão de um estudante português que em 1879 conhecia já
as grandes teorias económicas sufragadas pela Europa, já então,
industrializada, economicamente rica (alguns poucos países) e cujas monarquias
decadentes rivalizavam com republicanos conhecedores da ordem democrática e
sufragistas e socialistas utópicos na maior parte das vezes. Publica a sua
dissertação defendendo que uma economia moderna que promove o aumento da
produção e da riqueza, os impostos indiretos têm tendência a desaparecer, pois
o progresso social disso se encarregará.
No advento do século XVIII e
das lições de Adam Smith e de Montesquieu, serão os impostos indiretos e sobre
o capital, aqueles de que as suas teses dão primazia em detrimento da
importância suscitada pelos impostos diretos, contrariando as teses existentes.
Depois, fui procurar os
estudos de Vauban que além de estratega e engenheiro militar também ficou conhecido
e reconhecido pelas fortalezas militares, e que deu um contributo interessante
e motivador de discussões e tratados ao defender que o imposto eficaz é o
imposto direto sobre o rendimento. Em face da situação de penúria e fome em que
vivia a população francesa, decorrentes das políticas de Colbert, Vauban
escreveu o Dime Royale, onde
introduziu o conceito de universalidade e de generalidade ao considerá-lo
aplicável a todas as classes. Segundo ele, é uma obrigação natural dos súbditos
de todas as condições contribuir na proporção do seu rendimento ou da sua
indústria, sem que nenhum deles possa razoavelmente se eximir, acrescentando
que o benefício da isenção de contribuição é injusta e abusiva. Propõe o
pagamento sistemático sobre a produção a uma taxa progressiva variável de 5% a
10%. Substituindo assim os pesados impostos a uma única contribuição incidente
sobre a matéria coletável.
Não ficou livre de críticas
profundas e na maior parte vindas da Corte, onde não se pagavam impostos pela nobreza,
pois segundo esta classe nobiliárquica « asseguram e servem o estado não terão
de o manter».
Em Portugal existem registos
de cobrança de impostos desde que D. Manuel I criou o real de água, em 1498, para o conserto de um poço em Elvas e
construção de um aqueduto para abastecimento da cidade. Rápido foi a sua
extensão a outras cidades e transações. Sabe-se da existência em Lisboa de um
imposto sobre a limpeza das calçadas que ficou denominado por realete. Havia
ainda o real sobre o consumo de vinho, carne, azeite, incidia um real sobre
cada arrátel, canada ou medida usada.
Em 1641 a tributação
generaliza-se pelo reino, com a criação da décima militar, resultado do esforço
feito com a Restauração de 1640, e ficando o país depauperado após o reinado
dos Filipes, mas à medida que foi evoluindo o sistema fiscal, a tributação dos
rendimentos foi criando impostos de vária ordem, e passou a ser feita através
de um conjunto de impostos que se denominaram cedulares ou de produto. Além
desta tributação parcelar (imposto de juros, imposto de renda, décima de propriedade),
em 30/11/1963 pelo Decreto-Lei nº45399 foi ainda criado o imposto complementar,
de sobreposição, tributando o conjunto de rendimentos conhecidos. Mais uma vez
como contrapartida para amortecer o esforço que a guerra do ultramar exigia e
para compensar as contas e a despesa do Estado.
Apenas com a reforma fiscal
de 1988, foram criados autonomamente o imposto sobre o rendimento de pessoas
singulares e o imposto sobre o rendimento de pessoas coletivas, imposto de
caráter único e progressivo, conforme exigido pelo nº1 do artigo 104º da
Constituição da República Portuguesa, substituindo e extinguindo inúmeros
impostos e contribuições.
Paradigmática é a
expressão de Benjamim Franklin: nada é mais certo neste mundo do que a morte e os impostos.
Jean-Marc
Daniel,
Oito Lições de História
Económica, 1954
Manuel
Martins – Dissertação
Académica para a cadeira de Finanças, 1879
Saldanha
Sanches – O Imposto Complementar como Imposto do Rendimento (Revista Juridica,
nº4 Mar/Maio de 1984)
Valentin
Vasquez de Prada
– História Económica Mundial, 1989
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